Brasil: Conivência de governos com privatização explica queda de matrículas públicas

Pesquisa mostra que, enquanto o número de matrículas de escolas estaduais diminui significativamente, as do sistema privado aumentam. “A queda do número de matrículas nas redes públicas se explica também pela conivência de alguns governos com a privatização do ensino”, afirma autor

Fuente: Viviane Tavares | Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz)

Foto: Leo Drummond/Agência Nitro

O avanço da privatização na educação já vem sendo anunciado há tempos por matérias da EPSJV/Fiocruz. Pesquisa realizada pelo professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF) Nicholas Davies, que avalia a evolução das matrículas no ensino fundamental de 1997 a 2012, bem como a evolução das matrículas na educação básica de 2006 a 2012, com base nos censos do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), mostra que as redes estaduais estão cada vez menores enquanto as privadas avançam, reforçando essas denúncias.  Segundo o pesquisador, é importante notar que, embora o número de matrículas tenha avançado no sistema privado e no municipal, este crescimento não absorve a perda do número de matrículas estaduais. “De um modo geral, as matrículas públicas caíram. As estaduais caíram praticamente 19,2%, as municipais caíram 8,7%, já as matrículas privadas cresceram 13,3%. Mas o que é importante observar é que o crescimento das privadas não absorveu a queda das demais”, explica. De acordo com o professor as matrículas estaduais no ensino básico diminuíram mais de 4.453.651 milhões, as municipais 2.018.677 milhões e as privadas aumentaram 976 mil entre 2006 a 2012.

De acordo com os dados da pesquisa sobre a educação básica, em 2012, os estados que tinham proporcionalmente o menor número de matrículas na rede estadual eram o Maranhão, com 20,4%, Ceará, com 21,2%, Alagoas, com 24,3% e Rio de Janeiro, com 25,9%. , A participação do município ficava com 70% no Maranhão, 60,2% no Ceará, 61,4% em Alagoas, e 55,5% no Rio de Janeiro. Mas os números mostram que a participação da iniciativa privada também vem crescendo nesses estados, atingindo 9,7% no Maranhão, no mesmo ano, chegava a, 14,3% em Alagoas e 18,6% no Ceará. Ganha destaque no estudo a situação do Rio de Janeiro, onde o ensino privado já tem 27,9% das matrículas, mais do que a rede estadual. Entre as regiões, as redes privadas tiveram aumento variado: 11,3% no Nordeste, 5,1% no Sul, 16,6% no Sudeste, 9,9% no Centro-Oeste e 20,3% no Norte.

Ensino fundamental

Quando comparados à realidade apresentada em 1997, na pesquisa que avalia apenas o ensino fundamental (e não toda a educação básica), esses números ficam ainda mais alarmantes. No Ceará e na Bahia, por exemplo, as redes estaduais diminuíram sua participação em 86,3% e 76,4%, respectivamente. O estado do Ceará fica com 5,3%, Maranhão, com 9,5%, Bahia, com 13,7%, Rio de Janeiro, com 14,1% e Alagoas, com 15% de participando das redes estaduais, enquanto a participação municipal fica com 82,4% no Maranhão, 75,9% no Ceará, 71,8% em Alagoas, 73,9% na Bahia e 58% no Rio de Janeiro. Nos mesmos estados, a participação da iniciativa privada chega a ser quase igual à estadual. Já no Rio de Janeiro e Ceará, também em relação ao ensino fundamental o número de matrículas da rede privada ultrapassou o da rede estadual. ‘Isso demonstra o aumento da omissão dos governos estaduais, que já era grande no Nordeste mesmo antes da implantação do Fundef, em 1998. A consequência é a responsabilidade crescente e muito maior das prefeituras nordestinas pelo EF, apesar de elas de modo geral terem pouca receita própria’, aponta o relatório.

De acordo com a análise, as redes estaduais vêm diminuindo muito mais no Nordeste, 67,4%, do que no Sul, 32,6. As médias do Norte, Centro-Oeste e Sudeste são parecidas: 43%, 40% e 48,9%, respectivamente. Ao mesmo tempo, as redes municipais cresceram 87,8% no Norte, 59,7% no Sudeste, 38,3% no Centro-Oeste, 4,6% no Sul e 11,8% no Nordeste. As redes privadas tiveram aumento variado: 5,6% no Nordeste, 5,8% no Sul, 18,9% no Sudeste, 22,5% no Centro-Oeste e 27,9% no Norte.

Motivos da redução

Para o professor, o que chama a atenção, – para além destes alunos que ficaram fora da escola e não foram absorvidos por nenhum sistema, – é a diminuição do número de matrículas, após a implantação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) em 1997, – que se transformou em Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) em 2007. Isso porque, no Fundeb, parte da receita estadual e municipal é condicionada ao número de matrículas. “Não dá para entender por que os governos promoveram a municipalização, após a implementação do Fundef. Eu posso levantar algumas hipóteses: uma delas é os governos quererem se livrar da responsabilidade em relação ao ensino fundamental e, além disso, enfraquecer os sindicatos estaduais de professores que, de modo geral, são mais fortes nas esferas estaduais”, arrisca.

Davies informou que o número relacionado à queda de matrículas também tem sido atrelado à queda da taxa de natalidade, o que, segundo ele, é um argumento pouco consistente. ‘‘Isso não explica, porque isso teria que acontecer mais ou menos da mesma forma em todo o território nacional. O principal problema, portanto, ao meu ver, é a evasão. Se os alunos não têm um serviço de qualidade, sobretudo do ensino médio, eles largam” explica e acrescenta: “A queda do número de matrículas nas redes públicas se explica também pela conivência de alguns governos com a privatização do ensino, não pela venda de escolas públicas, mas sim pelo fechamento de escolas ou vagas ou uma política deliberada de deterioração da qualidade das escolas, por meio de uma série de medidas, como a desvalorização salarial dos professores”.

Caso do Rio de Janeiro

O estudo mostra ainda que o estado do Rio de Janeiro teve o maior declínio percentual de matrículas na educação básica de todas as redes públicas do Brasil, caindo de 1,5 milhão para 973 mil, uma redução de 34,7%, ou 537 mil matrículas. “O mais grave é que o Rio de Janeiro é o único estado em que a rede privada, com 1,049 milhão de matrículas, era, em 2012, maior do que a estadual”, explica ele. A média nacional das redes estaduais era em 2012, 2,5 maior do que as privadas. Na região sul, este número chega a ser 3,5 vezes a mais.

Nicholas Davies informa que o estado do Rio de Janeiro tem a terceira maior receita de impostos de todos os governos estaduais, só perdendo para São Paulo e Minas, uma receita que quase dobrou entre 2006 e 2012. “Em 2006 foi de cerca de R$ 18 bilhões, subindo para cerca de R$ 36 bilhões em 2012. Estranhamente, pois as matrículas diminuíram drasticamente neste período, – as despesas declaradas pelo governo em educação aumentaram de R$ 3,580 bilhões, em 2006, para R$ 5,455 bilhões, em 2012′ informa e indaga: “Como explicar tantas inconsistências? A terceira maior receita de impostos dos governos estaduais, o aumento significativo de despesas declaradas em educação, e a redução enorme das matrículas na educação básica?”. E completa: “Existe muita maquiagem nos gastos. O governo adota as interpretações mais variadas da LDB, portanto, usando o dinheiro da educação para pagar aposentados, que deveriam ser pagos com o montante da previdência, com compra de equipamentos que não necessariamente vão ser destinados às escolas”, exemplifica.

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